Claustro

A vida monástica tem algum sentido hoje? Vejamos este fato: recentemente um dicionário inglês da Oxford University Press, destinado aos jovens, gerou polêmica ao excluir do seu vocabulário1 palavras associadas à missa e à vida monástica, tais como altar, capela, bispo, batizar, paróquia, púlpito, santo, pecado, abade, abadia, monge, mosteiro. Foram excluídas porque teriam caído em desuso, por não fazerem mais parte da vida das pessoas. Deixando de lado se isto não revelaria uma marginalização do cristianismo na cultura ocidental, consideremos apenas o fato de que vivemos num mundo multicultural e em constantes mudanças. E, se mesmo entre nós cristãos a vida monástica ainda tem sentido, é pensada de forma romântica e fictícia, em que o mosteiro aparece como um lugar retirado à beira de um magnífico lago, ou no alto de uma bela montanha; já o monge, um contemplativo alheio às realidades da vida do homem comum. São caricaturas que não penetram a identidade mesma do ser monge nem o dinamismo da vida em um mosteiro; ademais, por vezes, são referidas antes a budistas ou a hindus.

Então, que é ser monge hoje? De maneira simples, afirmo que ser monge, em qualquer tempo e lugar, é tornar-se humano – defrontar-se com a própria existência e empreender a busca de dar-lhe um sentido mais pleno e totalizante. Não é coisa fácil nem banal, tornar-se humano, isto é sempre desafiador! Ao contrário, é antes com a desumanização que nos deparamos: o desemprego, a pobreza, a fome e a violência, frutos de nossa indiferença diante do mal e da injustiça, do consumismo de mercado que nos leva à escravidão da droga e do hedonismo. Mesmo a racionalidade pode nos brutalizar, levando-nos a nos aprimorar na arte de fazer o mal.

Felizmente, pelo trabalho e no convívio, triunfa o maravilhoso fazer-se humano: as artes, as ciências, a política, o esporte! Gerar e educar um filho, cultivar uma amizade, apreciar sabiamente as coisas e os momentos, mesmo quando marcados pela dor e pelo sofrimento! Ser humano não acontece espontaneamente, sem o concurso consciente da pessoa. É necessário seu agir, livre e responsável, atuando em sua vontade e em suas faculdades. Mas nem todo aquele que se esforça em ser humano é monge. Na verdade, monge é coisa rara! O que lhe é peculiar é, sobretudo, assumir a aventura da vida humana fundando-a inteiramente na relação com o Sagrado. O monge cristão o faz no segmento de Jesus, cuja divina humanidade o inspira a corresponder ao amor de Deus. Mas, mesmo isso não é específico do monge, pois na Igreja há muitas outras formas de vida dedicadas totalmente a Deus.

Portanto, além de definir a vida monástica como busca verdadeira de Deus, deve-se acrescentar ainda a maneira como o monge o faz: pela busca da purificação do coração, da perfeição humana, mediante o renegar-se a si mesmo através da fuga do mundo, do desapego das coisas, do recolhimento, do silêncio, da meditação e da contemplação, como práticas do Evangelho: “Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus!” e “Todo aquele que tiver deixado casas, irmãos, irmãs, pai, mãe, filhos, ou terras, por causa do meu nome, receberá muito mais e herdará a vida eterna.” (cf. Mt 5,8; 19,29).

Tanto no esvaziar-se de si, quanto na fuga do mundo, o monge, em seu aniquilamento, diante de seu tempo e onde se encontra, assume uma existência contestatória, que suscita novidade e provocação. Assim, caracteriza-se antes por propor perguntas que dar respostas. Não se confunde com a massa dos humanos, mas dela se retira, não por desprezo, mas por deferência à mesma humanidade que, contemplada em si e nos outros, instiga-lhe a partir ao encontro de Deus.

1. cf. Passos, Revista mensal de CL, ano XXIV, nº 101, jan./fev. 2009, p. 27.

D. Abade Matthias Tolentino Braga OSB, Mosteiro de S. Bento de S. Paulo, 27/06/2009.